Fluxo de pensamento #1

“Eu sou o sol”, o centro do universo, o centro de mim, héliocêntrico, voz grossa, sou o todo poderoso no meu mundo, na minha órbita, no meu círculo ao meu redor, eu sou o alter de mim e a diversidade que preciso, sou branco, sou negro, sou alien, sou não identificado, sou o certo e o errado.

Eu sou o câncer de pele, se alastrando, eu sou a personificação tíbia, balbuciante da existência, sou o drama adolescente, sou a crise econômica, eu sou o meu país em guerra, guerra na fronteira, guerra civil, expansão e recuo, tomada e retirada, eu sou a palma da mão que se perdeu com a explosão, eu sou a instabilidade dos países pobres, eu sou a ganância dos países ricos.

Eu sou o mundo, meio iluminado meio escuro, eu sou o mundo quando sou um deserto, com petróleo nas minhas entrâncias, eu sou o mundo, mundo, vasto mundo, variado e diverso, meu ouro negro impedindo meus pássaros de voar, sufocando a diversidade da minha fauna.

Eu sou a fraqueza do homem que não ajuda o semelhante por medo que este não aproveite a oportunidade que eu daria, e que grande oportunidade, trocados contados pra sobrar dinheiro para o ônibus. Eu sou o que prefere alimentar a dar dinheiro, o que preferia não ter dinheiro, mantendo as mordomias da vida moderna. Eu sou o egoísmo disfarçado de caridade, “espero que deus guarde meu lugar no céu”.

Açaí, leitores fáceis e conhecer para destruir

 

No vídeo acima, Djavan explica a canção açaí, e diz ter sofrido punição em decorrência da ignorância da crítica.

Eu por muito tempo busquei fazer poemas bem elaborados, com métrica, com rima, tentando manter o ritmo, porém é uma frustração ver que texto escritos de forma básica alcançam uma valorização tremenda. Por muito tempo me escudei atrás de “eu não posso ser culpado pela ignorância dos outros”, ou como disse Vital Corrêa de Araújo, “eu desprezo o leitor fácil”.

Só que como poeta, hoje eu me vejo na obrigação de “mostrar cultura pra esse povo”, não que eu seja uma hecatombe cultural, mas o que eu sei eu tenho que passar pra frente em prol da valorização dos textos bem escritos, e na esperança de que surjam novos grandes poetas que cuidam para lançar textos primorosos.

Alguns hão de argumentar “mas, Pedro, o modernismo veio para acabar com essas regras e para que possamos fazer nossos poemas como bem entendermos”, de fato, mas os poetas da geração de 22 eram competentíssimos para fazer poema do jeito que eles quisessem porque eles sabiam das regras que a poesia parnasiana aplicava, inclusive, para mencionar modernos posteriores à geração de 22, Cecília Meireles e Vinícius de Moraes têm sonetos perfeitos em termos de ritmo, métrica, rimas, e também tem poemas que não utilizam esses recursos.

Uma pequena digressão: Isso me lembra de um técnica de empreendedorismo que alguns chamam de “conhecer para destruir”, basicamente, o empreendedor tem que conhecer a fundo sua área de atuação para dessa forma poder inovar dentro dela, entendem?

É por isso que vou publicar aqui alguns artigos sobre a teoria do verso e sobre outras coisas relacionadas a escrita de poemas e de prosa, não posso prometer quando essas postagens ocorrerão, porém vou tentar manter a periodicidade de domingos alternados, por enquanto.

Me conta o que você acha, me conta como você escreve, o que te inspira, vamos todos trocar experiências, para que essa experiência seja a melhor possível.

Revelação sobre o monte Selene – Sonho

Essa é a segunda parte de um conto, caso não tenha visto a outra postagem é melhor ir para a primeira parte ( https://pedroaugustof.wordpress.com/2016/04/29/revelacao-sobre-o-monte-selene-o-chamado/ ), mas se você já está acompanhando os acontecimento, é só seguir a leitura.

***

Naquela noite, Josué selou o jumento, e pôs três pães e um cantil cheio em uma bolsa, após os preparos para o dia que seguia, repousou a cabeça e adormeceu. No meio da noite, abriu os olhos e viu a si mesmo chamando seu nome, convocando-o para segui-lo, levantou-se atordoado e seus pés se movimentaram no caminho que era precedido por seu eu que ia a frente. Viu uma enorme onda de areia engoli-lo, mal enxergava o que ocorria a sua frente. Pôde identificar a queda do braço direito daquele que o precedia, ao se aproximar viu o membro esquálido, apenas pele cobria o esqueleto. Pouco após o outro braço também cedeu do tronco e findou ali seu rumo, mais fino que o anterior, entretanto seu eu que ia a frente agora pareceu movimentar-se mais rápido. Estafado, Josué avistou o fim da tempestade de areia ao mesmo tempo que o seu eu que caminhava a sua frente ajoelhou-se fatigado, sem braços, a cabeça daquele pendeu pra frente e num mergulho sumiu no meio da areia. Josué correu ao exato ponto em que parara o seu guia e ali encontrou a margem de um lago límpido e cristalino, no qual pode ver um homem magérrimo, jovem de alma envelhecida, rugas profundas acentuando cansaço, sua própria imagem ali refletida, e sem braços.

Num sobressalto, Josué despertou na escuridão, seus braços estavam onde sempre estiveram. Ao longe os primeiros raios de sol anunciavam que era o momento de partir, pegou a bolsa com os três pães, subiu sobre o jumento já selado e partiu.

 

links:
Parte 3 – Esforços
Parte 4 – Vila 
Parte 5 – Ascensão

Cada palavra não dita

É maldita pelos sentimentos

A boca não diz o peito grita

Imagina o pensamento

Pobres silente amados

Tão seguros à beira do abismo

Se amam no olhar, se odeiam calados

Abandonam-se ao sofismo

Coitado, o que for sincero

Descortinar-se-á a verdade

Atingir-lhe-á o desespero

O outro com tranquilidade

E destreza esconderá o vero

Simulando caridade

Escorre pelo bico da pena

O sangue que corre em minhas veias

Quando lessem não fariam cena

Pois escrita é chama que incendeia

Quando o ritmo a palpitar

“Diga trinta e três”, diz o doutor,

O meu coração também está

“Não acho a causa da sua dor”

“Não faz mal, ninguém acha mesmo”

Mas insistem em apontar dedos

Enquanto flano, sozinho, a esmo

Escondendo insegurança e medos

Não sei agradecer tua preocupação

Por mim que por você guardo admiração

Tua força sem par e determinação

O teu abraço lar e eu numa contramão

Minha dúvida é sempre, como que suporta

Todo o peso do mundo sempre a tua porta

Quisera eu um dia nessa senda torta

Encontrar tua força e o beijo que conforta

Tolo eu por te encher com problema, egoísta

Em risco te perder, te perder da mi’a vista

Não te valorizando como gran’ calista

Negando que é você que me guia na pista

Não sei te demonstrar que tu és minha vida

Mas nestes versos poucos espero, querida,

Que veja em minha essência já tão carcomida

Te valoro almejando estar nós dois na ida

Nos vendem paixão como se amor fosse
Se é doce a paixão e deixa sem chão
Contudo é vão; no melhor, acabou-se
Derruba feito coice e nem dá mão

Já o amor, discreto, se ergue em colunas
Firme esqueleto que sustenta o teto
Não destrói, o vento; nem cobre, a duna
De calor abunda, se longe ou perto

Se por sorte me viesse o segundo
Venceria a morte, daria o mundo
Mesmo sem ser forte, faria de tudo

E ao findar o sonho, me ver sozinho
O que proponho só há se houver vinho
Pois suponho se real é daninho

Brado alto, orgulhoso
Perdido em teu alvoroço
Maravilhas do que é
Homem por fora, dentro mulher

Declaro-me satisfeito
Por ser cheio de defeito
Mas o que me cabe abarco
Não fujo de mim ao tesar o arco

Cada ser é bem como é
No mundo há homem e mulher
Cada em sua condição
Uns todo em si, outros interseção

Se vens a mim declarar-te
Minha rejeição faz parte
embora dentro mulher
Homem por fora é o que é

Paradysvogel

Não há ouro para todos
Só há ouro para tolos
Matéria não é etéreo
Contudo é o eterno

Com a luneta entre os olhos
Vislumbra distantes fogos
Lumiam sobre as cabeças
O que tudo quer que esqueças

No fim do túnel a luz
Que sempre se distancia
Busco tocar o Apus
Que da tua mente é cria

Ser tão humano

Sodoma e Gomorra em minha cabeça
Jardim do Éden em meu coração
Carrego no crânio um cacho de vespas
Levo no peito o mais perto de são

Entre tantos serei assim só eu?
Santo e ao mesmo tempo pecador
Sem saber o que é de deus e o que é meu
Na caixinha do altar que devo pôr?

Vivo num embate maniqueísta
Deus e o Diabo no mundo da lua
Para saber quem será o maquinista

E o sol caustica minha cabeça crua
E a mente por dentro é só o pensamento
Enquanto o instinto espera o momento