Revelação sobre o monte Selene – Vila

Essa é a quarta parte de um conto, caso não tenha visto as outras postagens é melhor ir para a primeira parte ( https://pedroaugustof.wordpress.com/2016/04/29/revelacao-sobre-o-monte-selene-o-chamado/ ), mas se você já está acompanhando os acontecimentos, é só seguir a leitura.

***

Dias de caminhada se seguiram, há muito que o segundo pão tinha acabado e o terceiro não anunciava durar muito mais. Ao alcançar o topo de uma duna, Josué pôde avistar ao longe uma cidade pequena, com poucas casas, onde talvez conseguisse que alguém o desse algo para comer.

As minúsculas casas eram separadas por espaços de um metro, ou menos, entre uma parede e outra, havendo muitos becos por onde o vento quente do deserto passava e se resfriava devido às diversas sombras, assim vila apresentava uma temperatura um pouco mais amena. Os moradores se apresentaram hostis a presença de Josué, portas e mãos se fechavam, mulheres saíam das ruas, homens enchiam o peito tentando primitivamente subjugar a possível ameaça.

Josué estava claramente desconfortável e acuado, a reação da cidade como um todo não poderia ser pior, ainda mais para um pedinte como ele. Quando de um beco estreito e escuro uma mão salta agarrando-o pelo pulso, fazem-se distinguir dois brilhantes olhos castanhos, pertencentes a uma senhora de cabelos desgrenhados que a adaptação dos olhos à pouca luz aos poucos permitia enxergar. Uma voz empoeirada emerge da garganta da velha, suplicando:

– Não vá, por favor, não o encontrará lá!

– Que disse, senhora? – Josué pergunta, com as pupilas dilatadas e suor frio brotando de sua testa.

– Dor, achará dor e sofrimento, não vá!

– Com outro me confunde…

– Não, és Josué, que vem de muito distante

– Muito mais embora – Josué se sente tomado pela vaidade de ter sido reconhecido, sua fama já o precedia, apesar de tudo.

– Encheu-se de fé, mas razão cambaleante – A velha retruca fazendo pouco do rapaz.

– Pois a sua funde – A resposta indignada é seguida de nuvens que cobrem o sol, os olhos da senhora brilham cada vez mais, Josué sente-se assustado com a coincidência de eventos. A velha tomada por um tom profético, e uma lufada que levanta seus cabelos fazendo-a parecer bem mais alta, diz:

– Homem ouvir conselhos não te convém, a eles responde como um… um bruto, nem mesmo percebe o mal que te vem, mas, ouça, o que falo é vero absoluto!

“Luneta na testa vê nada além. Árvore oca cresce e não dá fruto. Nesta senda, segue sei que por bem, alcançará, se tanto, apenas luto.”

“Colhe tempestade quem planta vento. Teus passos te guiam ao Cramunhão. Busque evitar tamanho sofrimento, deixe para lá seguir na missão. Quem te avisa decerto é amigo, agora decida, pois nada o obrigo.”

Toda a atmosfera anterior se dissipa e os pés de Josué correm sem hesitar, antes de sair da cidade Josué avista um alforje, equipado com uma bainha e uma faca, e uma bolsa com comida, ambos pertencentes a um homem que, dali próximo, selava sua montaria, as mãos de Josué, tão rápidas quanto os pés, tomaram ambos consigo e se afastaram antes mesmo que o dono conseguisse reagir.

Josué retorna ao local onde tinha deixado seu jumento e põe sobre ele o alforje e segue rumo, verificando o que havia obtido e o ocorrido, sem conseguir sequer compreender o que a velha havia lhe dito e crendo que o homem distraído selando o animal era indicativo de boa fortuna, pois agora tinha provisões para se manter até o fim da viagem ou bem perto disto.

Seguiram-se dias de caminhada com paradas apenas para alimentar-se e dar descanso ao animal que o acompanhava. A comida, a água, como no início da jornada mantinham-se sempre à beira da escassez, todavia o ânimo não se perdia, pois não se via só.

Tomou a distância a cada passo, rumo ao seu destino, avistou o monte Selene quase no mesmo instante que seu alimento acabou, se por um lado teve dúvidas se conseguiria, por outro já estava muito próximo para parar. Com esforço manteve-se firme em seu intento até estar subjugado pela grandiosidade daquela montanha que tanto sofrera para tocar.

 

links:
Parte 5 – Ascensão

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